O
isolamento/distanciamento social em função do Covid-19 modificou a rotina de
todos. Famílias se dividindo em casa e no trabalho, precisando dar conta da
rotina doméstica, de trabalhos remotos e do cuidado com as crianças, já que as
escolas também estão paralisadas. Este cenário afeta o emocional de todos e a
pergunta que fica martelando na cabeça é: estou sendo produtivo nas minhas
atividades?
Vivemos
em uma sociedade competitiva, em que o ócio é visto/entendido como flauteio. Mas,
em tempos de pandemia, ele se torna fundamental. Precisamos manter nosso
equilíbrio emocional e, uma forma de garantir isso é nos permitirmos vivenciar
a caixinha do nada. Além disso, este é o momento de praticarmos a empatia,
palavra que se tornou popular, mas que, muitas vezes, é projetada somente como
algo que soa bonito e belo.
Nessas
circunstâncias, me senti desafiado enquanto professor, que vivencia a prática
de sala de aula presencial. Considero-me um professor humanista, com um olhar
atento ao desenvolvimento do cognitivo dos alunos, considerando suas emoções e
contextos. Mas, como dar conta de desenvolver os conteúdos remotamente,
mediante uso das tecnologias de informação e comunicação (TICs), considerando
as dificuldades encontradas pelos alunos?
Penso
que o melhor é fortalecer o discurso e a prática que a lista de conteúdo
programático não é algo estático, que precisa ser “vencida”. Com vistas ao
favorecimento de uma aprendizagem significativa, alguns conceitos e
procedimentos se tornam difíceis de serem orientados à distância, ainda mais
quando se fala de alunos do ensino médio. Tendo um planejamento inicial, as
atividades foram se adaptando a essa nova realidade, sequências de conteúdos
foram invertidas, alguns conceitos foram deixados em standby.
A
internet está recheada de vídeo-aulas, de todos os tópicos, de praticamente
todas as disciplinas. E nossos alunos utilizam desse recurso para estudar em suas
casas. Por que não aproveitar e ter um contato mais próximo com os alunos e
gravar a minha própria aula? Nas últimas sete semanas, os alunos têm recebido
um link de uma aula gravada, a qual
sempre inicia com um desejo de que todos estejam bem e que o melhor caminho
para voltarmos a nos encontrar, com saúde, é respeitar o isolamento/distanciamento
social. E este início é a melhor parte da aula. Somente depois disso discuto
alguns conceitos com aplicações práticas/cotidianas.
Intercalando
com as vídeo-aulas, os alunos têm semanas com poucas atividades a serem
realizadas. Geralmente estas aulas correspondem à postagem da resolução de
exercícios/problemas. Vale ressaltar aqui duas considerações importantes: (i)
não sobrecarregar os alunos com atividades é uma forma de contribuir com a saúde
mental deles; (ii) a resolução desses exercícios/problemas é feita com o máximo
de descrição possível. Várias folhas de ofício são utilizadas para resolver uma
lista de quatro ou cinco questões, as quais, em sala de aula, seriam feitas em
algumas poucas linhas. E essa é a principal mudança positiva para as minhas
aulas; apesar de ter clareza que é papel do professor tornar claro (e
explícito) para os alunos alguns conceitos/procedimentos e suas relações,
algumas vezes, na sala de aula, isso pode não acontecer, em função do diálogo
tomar caminhos diferentes. Mas, nas atividades remotas, preciso que o aluno
compreenda todas as etapas da resolução de uma questão, com um entendimento do
motivo pelo qual se adota tal estratégia/forma de resolução.
Depois
dos alunos terem assistido vídeo-aulas, terem acessado à resolução de
exercícios de forma detalhada, terem tido um tempo para assimilarem os
conceitos, a gente faz uma aula on-line, utilizando o Hangout Mett. Esse momento torna (ou pelo menos parece tornar) o
processo de ensino-aprendizagem mais dinâmico e interativo, sendo que os alunos
ganham vozes e aula deixa de ser unidirecional. As aulas on-line permitem que
os alunos consigam externalizar verbalmente o que estão sentindo emocionalmente
do isolamento, mas também de como estão relacionando/assimilando os conceitos
estudados. Por mais que eles tenham meu contato telefônico para enviar mensagem
utilizando o Whatsapp (o que agiliza o
desenvolvimento das aulas), falar num contexto que simboliza a sala de aula, dá
outro sentido para os questionamentos e afirmações.
A
maior frustação com as aulas remotas diz respeito à avaliação. Entendendo que
ela deve buscar indícios de aprendizagem significativa, numa realidade de sala
de aula, a maior parte das questões é discursiva e, as que envolvem raciocínio
matemático, devem ser justificadas mediante a realização de cálculos. Dessa
forma, é possível inferir a forma como os alunos estão compreendendo o conteúdo
e, ao mesmo tempo, repensar formas de fazer progredirem em relação às suas
dificuldades. Para isso, tudo aquilo que o aluno externaliza/produz, é
considerado. Por outro lado, num questionário on-line que, por facilidade de
acesso dos alunos, imperam as questões objetivas, fica inviável acompanhar o
raciocínio que o aluno fez até o resultado.
Dito
isto, o que fica é que aquele discurso de que o professor é indispensável, já
que vivemos num mundo tecnológico, com acesso instantâneo a qualquer
informação, “cai por Terra”. Pelo contrário, mostra o quanto somos
fundamentais, enquanto mediadores, no processo de ensino-aprendizagem. E esses
desafios impostos pelo isolamento social nos tiram da zona de conforto e obrigam
que nos reinventemos nas nossas concepções de ensino-aprendizagem.
Professor de Física
Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia
Farroupilha, Campus Santa Rosa
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